Cão sem Dono
Descendo a ladeira
Não sei o que acontece com Beto Brant. Ou talvez não saiba o que acontece comigo. A julgar pelos dois primeiros longas do diretor, achei que estivesse diante de um sério candidato a se tornar meu diretor nacional predileto. Os Matadores tem uma crueza e um ritmo que me cativaram e a intensidade dramática dos pouco mais de 60 minutos de Ação Entre Amigos eram vertiginosos. Depois disso, e apesar de as críticas serem na maioria favoráveis, não consegui gostar de mais nada do que ele fez. E o ápice de meu desagrado foi atingido com este Cão Sem Dono.
O filme se baseia num romance de um jovem escritor chamado Daniel Galera e é totalmente ambientado em Porto Alegre. Para os preconceituosos que ainda têm esperança de que o sul do Brasil ajude a dar mais civilidade ao resto do território nacional, esqueçam. As personagens são pálidas, limitadas, desmotivadas, exatamente como julgam o resto da grande massa nos demais estados.
O protagonista é um à toa, tradutor literário desmotivado, intelectualizado e inútil, capaz de recusar trabalho mesmo num estágio de pré-miséria. Claro, é um pequeno burguês, que pode manter esta aparência de intelectual entediado com o mundo porque, quando a fome aperta, ele vai pra casa da família filar um rango. Sabe-se lá como, arranjou uma namorada, muito mais bonita que ele, que tem mais sonhos que ele e funciona como um elo entre o marmanjão e o mundo que trabalha para ganhar dinheiro. Como 90% das meninas bonitas interioranas, ela nutre o sonho dourado da fama como modelo. Através dela, o rapaz tem alguma reação emocional, porque a personagem é atropelada por um taxista folgado e depois fica gravemente doente, levando o cara quietão a se desesperar e cair no vício. Não peça para elaborar mais porque não tem muito mais que isso na história.
Brant optou por trabalhar com caras desconhecidas do grande público, para conferir maior veracidade à história que é filmada em passo de cágado, sem "artificialismos", num cruzamento de Dogma 95 com Big Brother Brasil - sem a mis-en-scène global, claro. Quase parece um documentário a respeito daquelas pessoas desinteressantes. O diálogo é óbvio e de uma profundidade semelhante à das praias maranhenses, onde se pode andar quase um quilômetro com água na cintura. O produto é um Brasil sem conteúdo, desmotivado, sem recursos emocionais e conformado com a vida tragicamente vazia que leva. Será que era este o objetivo deste filme? Se era chamar atenção para a inviabilidade de um país formado por gente assim, ele é um gênio. Por todas as outras interpretações, trata-se apenas de um filme muuuito chato.
Cotação: zzzzz...